sábado, 21 de julho de 2007

Peixe-mico


Era um daqueles amadores da arte da pesca. Amava tanto que empregou grande parte de sua renda em equipamento profissional, a despeito da opinião da esposa.
Aceitou o convite para pescar em uma lagoa criatória superpopulada, no município de Iapu, por mera consideração ao desesperado proprietário. “Com peixes sobrando, assim, não tem nem graça...” – comentou com o amigo e parceiro de pescaria.
Mas não dispensou a parafernália: molinetes, puçás, iscas eletrônicas, sonares etc.
A lagoa não era pequena. Trezentos metros de largura por quinhentos de comprimento.
Mal entraram na água e sentiram os peixes beliscando. Não as iscas, porque não haviam preparado as varas de pesca, mas seus pés, suas pernas, suas coxas. E, antes que beliscassem outras partes, saíram da lagoa e escolheram uma elevação do terreno, à beira, para iniciar sua missão.
Havia tantos peixes que nem precisavam de varas. “Pô, isso não é pescaria!” – reclamou irritado – “Parece mais colheita...”
Tirou a vara da água, determinado a acrescentar alguma dificuldade na tarefa e viver um mínimo de emoções. Preparou um lançamento longo, vislumbrando alguns metros à frente, em busca de algum peixe teimoso. Cuidadoso que era, olhou pra trás, para um lado e para o outro, certificando-se da inexistência de desatentos na zona de risco do lançamento. Acordou o profissional adormecido dentro de si e executou com arte, elegância e maestria o gesto de lançamento.
Não fosse a adrenalina excessiva produzida pela irritação de minutos antes, seria impecável. Mas essa força adicional conduziu a linha por sobre a lagoa, ultrapassando a margem, o gramado em volta, a cerca da propriedade, a estrada marginal à cerca, o bosque marginal à estrada e o anzol foi enganchar-se numa árvore indefinível, dada a distância.
Não se atreveu a balbuciar a palavra que pensou, mas estava estampada em seu rosto.
Após alguns minutos de inércia e consternação, o amigo sugeriu: “Puxa a linha, quem sabe você pescou um mico...”


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